A Veia Histórica de Juremir

Vozes da legalidade; política e imaginário na era do rádio (2011) é a mais nova amostra dos interesses históricos atuais de Juremir

16/10/2018 18:02 Por Eron Duarte Fagundes
A Veia Histórica de Juremir

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Com Getúlio (2004) a vertente histórica da obra do escritor brasileiro Juremir Machado da Silva começa a sedimentar-se. Depois ele compôs um notável ensaio sobre a questão negra na Revolução Farroupilha (aquela das “façanhas” dos “farrapos” gaúchos), História regional da infâmia —o destino dos negros farrapos e outras iniquidades brasileiras (2010) e um romance que é uma obra-prima ambientada nos primeiros anos de Era Vargas, 1930: águas da revolução (2010). Quando se pensa nas primeiras preocupações do escritor Juremir, escrevendo sobre as histórias do cotidiano, em A noite dos cabarés (1991) por exemplo, observam-se as mutações do ensaísta-ficcionista da juventude à maturidade, porém a constância da investigação humana e um verbo cujo barroquismo chega agora a despojar-se identificam a mesma vibração e a mesma energia de imagens e pensamentos.

Vozes da legalidade; política e imaginário na era do rádio (2011) é a mais nova amostra dos interesses históricos atuais de Juremir. Homem nascido na fronteira gaúcha, mas que ganhou o mundo, que faz uma ponte entre Palomas, na sua terra natal, e Paris, aonde vai seguidamente em busca dos espaços culturais que de fato lhe pertencem, Juremir mistura com habilidade suas origens populares com o refinamento a que chegou ao entrar em contato na França com alguns dos maiores pensadores de nosso tempo. Em Vozes da legalidade o homem do mundo está às voltas com um tema tão local quanto possível; o movimento da legalidade, que se deu no Rio Grande do Sul em 1961 como uma prévia dos embates ideológicos que culminariam na revolução de 1964, está tanto na boca das pessoas comuns (que se referem a ele citando os tempos míticos de Brizola sem explicar direito o que era) quanto na escrita de Juremir, empenhada em desvendar o que se esconde nesta névoa histórica, embora saiba que no fim nem sempre a voz (ou as vozes) da legalidade se aclare, mesmo que tenha um nome forte, o nome da voz, Leonel Brizola.

Depois de Getúlio Vargas, outro nome para abraçar as inquietações de Juremir, Brizola. Brizola talvez seja o gaúcho mais característico: mais até que Getúlio. Gaúchos que chegaram ao Brasil. Gauchismo no Brasil. Como certa vez disse o historiador Décio Freitas, o que talvez incomode em nós ao restante do país seja este “jeito de Brizola” que todos temos. E é este “jeito Brizola” que Juremir persegue ao longo de seu ensaio, pontuado por pesquisas, entrevistas e meditações.

“Conta-se muito quando se tem tempo e gosto.” Juremir sabe contar histórias. Numa determinada época, em face das citações e dos digressões de seus romances, se dizia que suas narrativas não tinham fluência, quebravam-se com referências e reflexões excessivas. Isto é falso: em poucos escritores brasileiros a linguagem consta tão bem uma história. O que ocorre é que o leitor de hoje talvez não esteja bem preparado para o instrumental de citações e pensamentos que Juremir traz para a literatura. Nos seus romances, Machado de Assis cita e reflexiona abundantemente: no século XIX isto foi um escândalo estético; hoje a leitura incorporou estes elementos machadianos que o leitor já nem se engasga. É o que lentamente vai ocorrer com as leituras dos textos de Juremir.

No caso de Vozes da legalidade estamos diante dum ensaio. Porém podemos lê-lo como se fosse um romance, como se fosse a sequência de 1930: águas da revolução. Jura-se que o prazer será maior.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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