O Colapso Verbal-Narrativo de Henry Miller
O norte-americano Henry Miller eh o mais inquieto e o mais revolucionario dos esp?ritos literarios ianques do seculo XX
O norte-americano Henry Miller é o mais inquieto e o mais revolucionário dos espíritos literários ianques do século XX, que me desculpem F. Scott Fitzgerald ou Truman Capote. Miller é tão pouco americano em seus voos às estratosferas da arte, mas ao mesmo tempo é tão americano em suas rabugices e caprichos. Seu barroquismo mental está inteiro em Plexus (1953), o segundo romance da trilogia A crucificação encarnada e talvez o cume das montanhas de autoficção erigidas pelo escritor.
Miller fala o tempo todo de si mesmo, sempre. Ele transforma eventos de sua vida em episódios duma ficção que renovou as letras do século XX. Um dos eventos da vida de Miller é sua ligação íntima como ser humano e artista com outro artista genial, o ficcionista russo Fiódor M. Dostoievski, que viveu e escreveu no século anterior àquele em que Miller viveu e escreveu. Parado diante da estátua de Dostoievski, Miller quer a revelação do segredo daquelas vidas de que só o russo tinha a chave; assim como o homem Miller, a literatura de Miller contempla a literatura de Dostoievski com uma admiração que é tão intelectual quanto ingênua; é desta mistura de rompantes intelectuais e genuflexões incautas que Plexus vai extraindo sua grandeza única.
Mas nem só de Dostoievski vive Plexus. As referências artísticas, especialmente literárias, são muitas e todas estas citações se casam admiravelmente na originalidade e pessoalidade de Miller. O que em citadores menos hábeis poderia desestruturar os elementos narrativos, gerando uma confusão de gêneros entre a crônica e a ficção, em Miller as coisas funcionam graças a seu gênio de esteta da palavra.
Plexus é uma obra difusa, vai muitas vezes meio de improviso intelectual, é como se o Thomas Mann de A montanha mágica (1924) abdicasse de seu rigor germânico e uma chuvarada de pensamentos sem método explodisse montanha abaixo. Plexus tem tentáculos perigosos, mas ao mesmo tempo luminosos; desmembra a ficção para recondicioná-la por uma montagem interna do escritor. O que teria tudo para ser um horrível vomitório pessoal se converte em achados de epistemologia literária.
(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)
Sobre o Colunista:
Eron Duarte Fagundes
Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br