A Saga do Cinema Brasileiro, Altos e Baixos de 2014
Rubens Ewald Filho faz um balanço do Cinema Nacional em 2014
Não há nada errado com o cinema brasileiro que um público mais atento e interessado não pudesse resolver. Por alguma razão o espectador normal ou costumeiro só vai assistir as comédias, em geral cariocas, com a mesma meia dúzia de atores, rendendo mais ou menos, dependendo de serem melhores ou piores. Sim, há um critério. Desde a época da chanchada dos anos 50 passando pela pornô chanchada dos 70, o espectador quer ir ao cinema para se divertir, distrair-se. E a imprensa é violentamente contra, no que esta também errada. Há comedias horrendas e outras nem tanto e até ocasionalmente algumas ousadas e politicamente fortes, como é o caso de O Candidato Honesto, não por acaso feito pelo diretor do gênero mais bem sucedido (Roberto Santucci) e o astro mais popular (Leandro Hassum). Talvez tenham sido francos demais porque assustaram a Esquerda política e mais uma vez não tiveram sua ousadia reconhecida! Leandro também anda fazendo filmes demais e já esta fazendo operação para perder peso (e no caso dele, tamanho é documento. Não é Faustão!),
Enfim, eu tenho procurado ver as comédias com o público e gosto de algumas: as da Ingrid Guimarães são divertidas, Fabio Porchat é um original e o pessoal da Turma da porta dos Fundos, criaram um estilo inteligente e especial. Posso dar um palpite. Eles funcionam melhor no You Tube simplesmente porque deixam um intervalo de respiração entre os sketchs, na TV embola tudo sem pausa de riso ou respiração. Sem ser exatamente cinema (hoje em diaporém é difícil separar o joio do trigo), são de qualquer forma uma maneira nova e sofisticada de fazer rir. Que outros como eles continuem a surgir.
Eu confesso que tenho dificuldade de entender porque o público não foi ver, por exemplo, a vida do escritor Paulo Coelho, Não Pare na Pista, a Melhor Historia de Paulo Coelho, que era muito bem realizado, tinha uma história envolvente, bons atores. Enfim, era Classe A e deveria interessar seu público alvo! Gostei muito de Boa Sorte, de Carolina Jabor, onde todo o elenco também brilho com especial destaque para Débora Secco. No caso, o filme realmente tem trama pesada envolvendo drogas e doenças terminais, e da para entender porque nem todos enfrentam o assunto. Não assisti até hoje certos filmes porque não consegui ir aos cinemas porque as assessorias de imprensa cariocas me ignoraram e não chamaram para nada. Mas ainda vou tentar ver Trinta, nem que seja para entender que teve a ideia de jerico de inventar esse nome para a biografia de Joãozinho Trinta (Trinta o que? Anos, quilos, êta titulo ruim) de Machline. E a Irmã Dulce então? Foi tão mal que sumiu antes de eu conseguir a folga.
Vamos tentar fazer um balanço do que teve de positivo: o documentário Esse Viver Ninguém Me Tira de Caco Ciocler, o bom e ignorado Mão na Luva, Os Amigos,de Lina Chamie (colegas o viram com tal mau humor que me escapa), Tim Maia era razoável mas perdeu para o show musical que era só alegria e errou feio em insistir em transformar em filme de drogado! O desenho animação gaúcho Até que a Sbornia nos Separe era muito legal e merecia mais do que passar em branco. Achei encantador Rio eu te Amo! Completamente ignorado por todos (credo, nem o Rio agora se pode amar?), Isolados era ao menos uma tentativa valida de fazer terror, Mercado de Noticias era outra prova do notável talento do gaúcho Jorge Furtado numa mistura inusitada de documentário, teatro, comédia, denuncias etc. Houve filmes juvenis adequados, mas o melhor mesmo foi O Segredo dos Diamantes de Helvécio Ratton. Infelizmente a maior parte dos filmes ficou num meio termo, não eram comerciais, nem atraentes, nem divertidos, mas tampouco eram ruins. Esse meio termo é o que há de pior para a sorte nas bilheterias. E muitos estão nesse caso, como Entre Vales, Entre Nós, até mesmo o grande diretor inglês Stephen Daldry não soube o que fazer direito com Trash A Esperança Vem Do Lixo, um filme de favela até inferior aos nossos (o elenco ao menos se defendeu bem com Wagner Moura sempre inventivo). Quando o diretor de Billy Elliott e As Horas não acerta, dá para valorizar os diretores brasileiros que escalaram o mesmo terreno e situações. E em certos casos até se deram melhor.
Tivemos Confissões de Adolescente, infelizmente mais fraca do que a serie original de TV, infelizmente eu perdi Quando Eu Era Vivo, mas claro que gostei de Eu Não Quero Voltar Sozinho, expansão de um certa de Daniel Ribeiro, que era ainda melhor. Mas é um filme encantador e que ao menos teve uma aceitação positiva. Pena não ter agradado a Academia talvez porque existam similares americanos em cada canto de lá. E na confusão de títulos não conseguiram ter paciência de o descobrirem.
O público nacional ficou meio chocado com Praia do Futuro, ou dizendo a verdade. Bastante, ainda mais ao ver o Capitão Nascimento virando gay e como disse um conhecido, assim na cara dura, sem um romancinho ao menos! Apesar disso, foi um filme melancólico e sério, uma evolução na obra do diretor. Lembro agora de Alemão, que foi até bem e ao menos era filme de favela com uma trama de suspense e algumas surpresas. Achei uma evolução no gênero.
Muitos filmes, porém tiveram que estrear em uma única sala, em geral do Itaú, às vezes em um único horário e mesmo assim tiveram sorte em ficar em cartaz mais de uma semana. Documentários, dramas independentes com frequência vindos de outros estados e premiados em festivais menores. Uma pena se gastar tempo e talento, dinheiro nem se fala, para tão pouco resultado. E ter que dar graças a Deus por ao menos ter isso. Ah, cinema brasileiro tanto ainda a corrigir e solucionar.
Sobre o Colunista:
Rubens Ewald Filho
Rubens Ewald Filho é jornalista formado pela Universidade Católica de Santos (UniSantos), além de ser o mais conhecido e um dos mais respeitados críticos de cinema brasileiro. Trabalhou nos maiores veículos comunicação do país, entre eles Rede Globo, SBT, Rede Record, TV Cultura, revista Veja e Folha de São Paulo, além de HBO, Telecine e TNT, onde comenta as entregas do Oscar (que comenta desde a década de 1980). Seus guias impressos anuais são tidos como a melhor referência em língua portuguesa sobre a sétima arte. Rubens já assistiu a mais de 30 mil filmes entre longas e curta-metragens e é sempre requisitado para falar dos indicados na época da premiação do Oscar. Ele conta ser um dos maiores fãs da atriz Debbie Reynolds, tendo uma coleção particular dos filmes em que ela participou. Fez participações em filmes brasileiros como ator e escreveu diversos roteiros para minisséries, incluindo as duas adaptações de Éramos Seis de Maria José Dupré. Ainda criança, começou a escrever em um caderno os filmes que via. Ali, colocava, além do título, nomes dos atores, diretor, diretor de fotografia, roteirista e outras informações. Rubens considera seu trabalho mais importante o Dicionário de Cineastas, editado pela primeira vez em 1977 e agora revisado e atualizado, continuando a ser o único de seu gênero no Brasil.