A Cronica dos Tempos de Guerra por Ballard
John Graham Ballard, um escritor britanico nascido na China, trouxe para a literatura esta fusao imperiosa entre o Oriente e o Ocidente
J.G. Ballard é um autor inglês mais conhecido no Brasil por romances que foram parar no cinema. O império do sol (Empire of the sun; 1984) é, confessadamente, autobiográfico. Diz Ballard: “Em sua maior parte, este romance utiliza acontecimentos que observei durante a ocupação japonesa de Xangai e no campo de Lunghua”. Quatro décadas depois de sua meninice em Xangai, no dia sete de dezembro de 1941, quando, no caos do ataque japonês a Pearl Harbor, o escritor então garotinho se extraviou de seus pais, Ballard transforma em literatura suas memórias duma infância meio trágica, pelo rompimento e pavor. Ballard retrata-se no pequeno Jim Graham, homônimo do autor, ele, Jim, uma jovem alma que se perde de seus pais na Xangai tomada pelos nipônicos. O rigor formal e narrativo de Ballard é um dado; as intenções de reconstituir a atmosfera e os episódios daquela distante Xangai da infância aproximam O império do sol duma crônica, em que a invenção está muito mais na linguagem que na trama; estas características semidocumentais, quase uma reportagem ficcional, afastam muito o texto do romance dos fundamentos mais comuns do universo de Ballard, os delírios surrealistas, e também representam um choque contrastante para quem viu o filme que o norte-americano Steven Spielberg extraiu do livro, pois Spielberg, comercialmente, vai em busca do melodrama, tanto na ruptura familiar no início do filme quanto no reencontro na (necessariamente) emocionante cena final.
Ballard é elíptico e menos emotivo ao aproveitar as memórias do reencontro. “Seus pais estão esperando por você, Jim.” Depois desta frase, salto para a parte final, já no cais de partida para uma pátria que Jim ainda não conhecia. “Dois meses depois, na véspera de sua partida para a Inglaterra, Jim lembrou das palavras do Dr. Ramsone, enquanto caminhava pelo passadiço do SS Arrawa e pisava no solo chinês pela última vez.”
John Graham Ballard, um escritor britânico nascido na China, em Xangai, trouxe para a literatura esta fusão imperiosa entre o Oriente e o Ocidente que é O império do sol, não um romance ballardiano no sentido habitualmente atribuído à sua obra mas igualmente capaz de captar o absurdo do humano dentro de coisas de realismo não-distópico.
(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)
Sobre o Colunista:
Eron Duarte Fagundes
Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br