Filosofia, Literatura e Linguagem em Luis Alterio

Luis embarca na navegacao de linguagem com seus versos

03/05/2021 18:22 Por Eron Duarte Fagundes
Filosofia, Literatura e Linguagem em Luis Alterio

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O FILÓSOFO

“—Ao ler na diagonal a obra ‘Zettel’ de Wittgenstein, a dada altura li, parei e reli outra vez a ficha 80, e continuo intrigado: ‘Qual é a forma pretérita de Tu vens, não vens’?”. Nos aforismos de Só os maus poetas são livres (2020) o escritor português Luís Altério deixa escorrer as anotações de um filósofo que se disfarça em cronista das ideias: as linhas são as de Michel de Montaigne, Blaise Pascal ou do próprio Ludwig Wittgenstein que lhe rendeu a perplexidade que abre este meu texto que tenta espiar a alma de Luís. Banhado pela luz dos trópicos, o texto extremamente luso de Altério adquire uma outra cor, cuja origem lexical e sintática nunca é traída mas é pouco a pouco e subterraneamente transformada. A filosofia em palavras de Luís parece muitas vezes dotada de dupla perplexidade: diante dos inesperados rompantes europeus como o de Wittgenstein e em face da demência brasileira nestas matas de cá.

O ESCRITOR

“sempre achei A Obra ao Negro a pedra filosofal do Grande Romance entre outras panaceias livrescas.” Marguerite Yourcenar, a escritora francesa, é uma boa pedra de toque para entender certas inspirações literárias de Altério. As origens alquímicas da personagem de Yourcenar perpassam, de alguma maneira, o olhar do escritor luso, mais no sentido humanista que místico. Zenão, um renascentista, é a visão que ilumina. Altério, em sua literatura, propõe alguma luz: ainda que, em seu descolorido pessimismo, possa descrer da eficácia iluminadora desta luz. Desde o título do livro, extraído de Cioran, “só os maus poetas são livres”, Luís transita em alguns paradoxos que ocultam os autênticos significados, como na criatura da romancista francesa: ser péssimo e livre, como numa arte à margem, lembro o cineasta brasileiro Rogério Sganzerla em seus filmes e declarações, é estar no verdadeiro limite de significações que interessa (o limite) à arte.

 

 

A LINGUAGEM

 

O poema é a suprema criação de língua e linguagem.
“A tensão de um verso
ameaça romper-se
trasfegar com afã
nexo melindrado para outros
versos
que por sua vez sofrem
angústias em versos.”

A língua navega. Em Camões. Em Fernando Pessoa. Luís embarca na navegação de linguagem com seus versos, que andam de cá para lá, tomam rumo, mudam de rumo. Há quebradas estranhas e necessárias. Na língua e na linguagem (que é o uso particular do idioma) o filósofo e o escritor se encontram com o homem da língua. Como escreveu o patrício de Luís, o escritor português Álvaro Romão em seu prefácio para a segunda parte deste livro, “Luís é um espectador atento da sua época e do mundo que o cerca.” Esta consideração de Álvaro me remete a uma constatação: esta atenção para o tempo histórico e o mundo em torno passa pelo esgrimista de pensamentos (o ser reflexivo), o homem de letras (aquele se vale com minúcias da palavra escrita para dizer do mundo) e numa atenção constante com a língua e a linguagem em que escreve onde tudo se junta. Quer dizer: nestas três características essenciais de Luís Altério está tudo o que interessa ao leitor mais empenhado destes anos esfumaçados do século XXI.

 

(Eron Duarte Fagundes – eron@dvdmagazine.com.br)

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Sobre o Colunista:

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes

Eron Duarte Fagundes é natural de Caxias do Sul, no Rio Grande do Sul, onde nasceu em 1955; mora em Porto Alegre; curte muito cinema e literatura, entre outras artes; escreveu o livro ?Uma vida nos cinemas?, publicado pela editora Movimento em 1999, e desde a década de 80 tem seus textos publicados em diversos jornais e outras publicações de cinema em Porto Alegre. E-mail: eron@dvdmagazine.com.br

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